sábado, 14 de janeiro de 2012

EVOLUÇÃO CLÍNICA DO INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO (IAM) SEM REPERFUSÃO- PARTE I


Antes da publicação dos primeiros estudos sobre o benefício da terapia trombolítica no infarto agudo do miocárdio (IAM), a partir da década de 90, e posteriormente, pela comprovação e uso difundido da angioplastia primária, o tratamento do paciente infartado era muito limitado, baseado no repouso, monitorização eletrocardiográfica contínua em UTI, no uso da chamada solução polarizante, analgesia com opioides, nitratos, beta-bloqueadores e infusão rotineira de lidocaína (que se mostrou prejudicial posteriormente), tratamento das arritmias. Neste cenário era muito comum a evolução com complicações, como insuficiência ventricular esquerda (IVE), choque cardiogênico e complicações mecânicas, como comunicação interventricular (CIV), insuficiência mitral aguda, aneurisma/pseudoaneurisma do  ventrículo esquerdo e ruptura da parede livre. Maior permanência em UTI, pela necessidade de drogas inotrópicas e ventilação mecânica invasiva, era uma das consequências. Todas estas condições estavam associadas a maior mortalidade (hospitalar e no seguimento) dos pacientes acometidos por infarto do miocárdio . 
Mas é evidente que muitos pacientes apresentavam evolução clínica satisfatória, sem complicações, mesmo sem terapia de reperfusão, a depender principalmente da extensão área necrosada do coração e do comprometimento contrátil do ventrículo esquerdo.
Hoje as diretrizes das Sociedades de Cardiologia indicam o emprego precoce da terapia de reperfusão. A reperfusão pode ser efetivada por meio da administração de trombolítico endovenoso ou pela realização de angioplastia, na sala de hemodinâmica.  Esta conduta deve ser realizada nas primeiras 12 h do início dos sintomas isquêmicos (angioplastia ou trombolítico), ou entre 12 e 24 h do início dos sintomas (angioplastia) na presença de pelo menos um dos seguintes: persistência dos sintomas isquêmicos, instabilidade hemodinâmica ou elétrica. Se houver choque cardiogênico, o cateterismo pode ser realizado por até 36h do início do infarto, visando à revascularização, sendo observado benefício no estudo SHOCK, associado a outras medidas (suporte hemodinâmico através de balão intra-aórtico e farmacológico).
Porém, para atender o grande número de pacientes com IAM, de forma rápida, há necessidade de uma estrutura adequada dos serviços de saúde, com disponibilidade de laboratórios de hemodinâmicas funcionando 24 h por dia. O atendimento da população não conveniada é realizado pelo nosso precário sistema de saúde, que apresenta deficiências que tornam esta tarefa difícil em virtude de vários fatores, a começar pelo preparo frequentemente inadequado dos profissionais que fazem o atendimento inicial, que muitas fezes não encaminham o paciente para angioplastia, ou não administram o trombolítico na impossibilidade de encaminhar para o laboratório de hemodinâmica. A logística do funcionamento dos serviços de hemodinâmica (aqui na nossa cidade a cargo dos hospitais privados, principalmente) apresenta limitações importantes, sendo que muitas vezes se recusam a receber os pacientes pela ausêcia de vagas em UTI. Mas o maior e mais grave problema são as condições deficientes de funcionamento do principal hospital de urgências do estado, como pode ser constatado nesta reportagem recente (Tribuna do Norte, 12 de janeiro de 2012); muitos pacientes com IAM são tratados fora do ambiente de UTI, em leitos improvisados.
Possivelmente como conseqüência da situação relatada, temos observados com maior freqüência pacientes com complicações decorrentes do IAM (CIV pós-IAM, choque cardiogênico, IVE, aneurisma do ventrículo esquerdo e com instabilidade elétrica-bloqueio AV); a maioria não reperfundidos, por motivos diversos: alguns são atendidos em vários serviços até finalmente ser internados, com intervalo de tempo muito longo (Δt), por impossibilidade de realizar angioplastia; por opção da equipe (negligência), por demora demora do paciente para procurar atendimento após os sintomas, entre outras causas. É como se estivéssemos voltando ao passado, época em que o tratamento do IAM era muito limitado, as complicações, frequentes e a mortalidade comprovadamente maior.


REFERÊNCIAS

1.   Antman EM, Anbe DT, Armstrong PW, et al. ACC/AHA guidelines for the management of patients with ST-elevation myocardial infarction (committee to revise the 1999 guidelines). J Am Coll Cardiol 2004; 44:671-719.
2.    Webb JG, Lowe AM, Sanborn TA, et al. Percutaneous coronary intervention for cardiogenic shock in the SHOCK trial. J Am Coll Cardiol 2003; 42(8):1380-6.

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